Faleceu ontem José Ruy, grande expoente da banda desenhada portuguesa.
Técnico de artes gráficas, decorador, autor de Banda Desenhada, ilustrador e pintor, José Ruy Matias Pinto nasceu a 9 de maio de 1930, na Amadora.
O seu entusiasmo pela BD vem desde pequeno, quando contactou com a revista O Mosquito. Tornou-se seu leitor desde o primeiro número (em 1936) e dedicou-se então a desenhar a sua própria versão de O Mosquito.
O seu talento natural pelo desenho fez com que ingressasse na prestigiada Escola de Artes Decorativas António Arroio, em Lisboa, onde encontrou mestres e colegas que marcaram a sua carreira.
Por essa época conheceu José Garcês e Eduardo Teixeira Coelho (ETC), dois nomes cimeiros da BD portuguesa, com quem travou amizade e foram seus cúmplices em diferentes projetos.
De modo a aperfeiçoar o seu traço, durante longo tempo foi visita frequente do Jardim Zoológico de Lisboa, onde desenhou os mais variados animais em diferentes posições.
No final de 1944 começou a colaborar com a revista O Papagaio, com ilustrações, contos e banda desenhada.
Colaborou, juntamente com ETC e com Domingos Saraiva, no célebre Cortejo Histórico de Lisboa, em 1947, dirigido por Leitão de Barros, comemorativo da conquista de Lisboa aos mouros, em 1147, ao nível da decoração. O mesmo Leitão de Barros contou com a sua colaboração e a de ETC também em trabalhos de decoração de alguns dos filmes que realizou e para o malogrado projeto da nau São Vicente, que se afundou no Tejo.
Em 1947 foi admitido na revista O Mosquito, que se tornou num dos mais emblemáticos títulos de sempre da BD portuguesa, mantendo-se ligado a O Papagaio. Nesta I série de O Mosquito publicou apenas uma história de BD, "O Reino Proibido", em 1952, tendo trabalhado na preparação da coloração da revista, num complexo processo litográfico em que também trabalhou no efémero O Gafanhoto.
Participou com ETC na organização da Exposição de Literatura Infantil, realizada no Palácio da Independência em Lisboa, em 1952, onde se apresentou um núcleo de BD dos dois autores, muito antes de se tornarem habituais as mostras de quadradinhos.
Outro título célebre em que colaborou foi também o Cavaleiro Andante, dirigido por Adolfo Simões Müller, onde publicou, entre outras histórias, Peregrinação de Fernão Mendes Pinto (segundo o texto original), Ubirajara (com argumento de José de Alencar) e O Bobo (adaptação da obra de Alexandre Herculano), editadas em álbum em 1982 (as duas primeiras) e em 1989.
Com o aparecimento da II série de O Mosquito, em 1960, tornou-se diretor artístico da publicação, que incluía histórias e ilustrações da sua autoria. Em paralelo, desenvolveu atividades para outras editoras como maquetista (hoje chamar-se ia responsável gráfico ou até designer), como sucedeu com as Publicações Europa-América, a Livraria Bertrand ou a Editorial Íbis.
A série Lusitansos foi criada em 1972, com textos de João Paulo Madeira Rodrigues, publicada de início no vespertino A Capital e, mais tarde, editado em álbum, sob o título As Aventuras de 4 Lusitanos e uma Porca, em 1984.
Nas páginas da revista O Século Ilustrado colaborou como ilustrador com Artur Varatojo na secção ABC Criminal em 1971, com álbum editado em 1983.
Em 1979 apresentou A Vida Maravilhosa de Charles Chaplin nas páginas da revista Spirou (II série), editada em álbum em 1985. Ainda em 1979 recebeu o convite do Comité Internacional da Cruz Vermelha para realizar a História da instituição em BD. Embora o projeto mais vasto de edição em álbum nunca se tenha concluído, o autor realizou uma versão abreviada de 4 páginas, distribuída internacionalmente em várias línguas em 1985.
Adaptou Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões para a BD, inicialmente publicada no Jornal da BD em 1983, mantendo os poemas originais, numa monumental obra editada nesse ano em 3 volumes, sendo várias vezes reimpressa. No Jornal da BD publicou ainda diversas outras histórias entre 1983 e 1987. Na revista Tintin encontram-se várias curtas histórias suas, sobretudo de carácter publicitário.
Um dos seus trabalhos mais conhecidos é a série As Aventuras de Porto Bomvento, que narra as odisseias de um português na época da expansão marítima, cujo primeiro título, Homens sem Alma, foi editado pela Editorial Notícias em 1987 e os restantes sete foram editados pela ASA, entre 1988 e 1992, caso raro de longevidade na BD nacional.
Para a revista Seleções BD apresentou uma nova versão de O Bobo em 1988 (na I série) e três curtas histórias entre 1999 e 2001 (na II série).
Deste modo, José Ruy esteve particularmente associado a muitas das mais importantes revistas da BD nacional (somando-se ainda o Camarada, Pisca-Pisca e Mundo de Aventuras) e tem editados perto de quarenta álbuns, o que o torna num dos autores mais fecundos de sempre.
Importante também é o seu trabalho como ilustrador, tendo participado em vários livros e revistas, como Mundo Feminino, Almanaque Alentejano, Almanaque do Algarve, Seleções de Mecânica Popular e Diário de Notícias.
Desde os anos 90 do século XX tem produzido diversas histórias saídas diretamente em álbum sobre localidades de Portugal, como Amadora, Sintra, Porto e Caldas da Rainha, editadas pela ASA, pela Notícias ou pela Âncora.
Para além da vastíssima obra produzida, José Ruy é um incansável divulgador da BD, através de visitas (a escolas, bibliotecas e museus), de conferências, de artigos que escreve ou das exposições em que participa.
Foi galardoado com o Trofeu de Honra do Festival Internacional de BD da Amadora na sua primeira edição, em 1990, cidade que o distinguiu também com a Medalha de Ouro de Mérito e Dedicação.
O seu espólio de originais, esboços e pranchas de BD, foi por si doado ao Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem, na Amadora.
Biografia retirada da Infopédia
Ensaio de quadriculografia portuguesa aqui