22 de outubro de 2025

“Cadáver Esquisito”: A maior banda desenhada colectiva portuguesa ganha nova vida em livro

A banda desenhada Cadáver Esquisito, um projecto que reúne mais de 50 autores portugueses, acaba de ser publicada em livro pela editora independente Arga Warga. Concebida e coordenada por Daniel Maia, esta obra é descrita pelo autor como “a versão mais performativa que a BD pode ter, livre de constrangimentos”.

O projecto teve início em 2008, muito antes de as webcomics se tornarem tendência. Na altura, Daniel Maia decidiu criar um blogue próprio para acolher uma banda desenhada colectiva, construída página a página por diferentes autores. A regra era simples e inspirada no jogo surrealista cadavre exquis: cada autor ou dupla (argumentista e desenhador) acrescentava uma nova página, dando continuidade ou subvertendo a narrativa anterior, enquanto Daniel Maia assegurava uma coerência narrativa que unificasse o resultado final.

O resultado é uma história tão improvável quanto fascinante: “Um incidente num hotel precipita situações insólitas que revelam uma intriga. Uma trindade de Papas faz testes à inovadora tecnologia U.M.D. (Unidade Molecular Destemporizadora), criada pelo Prof. Octávio, que suspende o espaço-tempo numa área limitada.”

Entre 2008 e 2015, a obra foi sendo publicada online, atraindo uma comunidade crescente e diversificada de criadores. Muitos dos participantes eram nomes já reconhecidos da BD nacional, enquanto outros deram aqui os seus primeiros passos. Entre os mais de 50 autores estão André Caetano, Daniel Henriques, Diogo Carvalho, Miguel Mendonça, Kati Zambito, Zé Burnay, Hugo Jesus, Maria João Careto, Sónia Oliveira e Pedro Nascimento, entre muitos outros.

A edição agora lançada em livro reúne 58 páginas da versão original do webcomic, complementadas por uma nova narrativa intitulada A Vingança do Cadáver, que funciona como epílogo e encerra este ciclo criativo de forma inédita.

A apresentação oficial acontece no sábado, no festival AmadoraBD, o maior evento nacional dedicado à banda desenhada.

Com esta edição, Daniel Maia — que fundou a Arga Warga há duas décadas — concretiza um dos projectos mais ambiciosos da BD portuguesa contemporânea.

O autor, nascido em Lisboa em 1978, tem um percurso que abrange criação, crítica, produção e edição, tendo colaborado com editoras como Marvel, Dark Horse Comics, Platinum Pub., Chiaroscuro Studios, Ala dos Livros e Saída de Emergência Edições.

Cadáver Esquisito é mais do que uma banda desenhada — é um manifesto colectivo de liberdade criativa, um retrato da imaginação nacional e da força da colaboração artística.

Cadáver Esquisito, colectivo, Arga Warga, 64 pp., p&b, capa mole, 10€

Solo Leveling #15

O décimo quinto volume de Solo Leveling marca o limiar entre a vitória e o desespero. Sung Jin-woo, outrora um caçador débil e inseguro, encontra-se agora diante de forças cuja magnitude ultrapassa os limites da compreensão humana. Este volume constitui, por conseguinte, um ponto de inflexão na narrativa: é aqui que a história abandona a escala individual e se projecta sobre o destino do mundo inteiro.

A escrita de Chugong mantém o seu ritmo intenso e cinematográfico. Cada combate é descrito como uma sinfonia de poder e de destruição, mas, sob o espectáculo da acção, esconde-se uma meditação mais sombria sobre o isolamento do herói. Jin-woo, transformado em monarca, compreende que a força absoluta cobra um preço: a distância entre si e a humanidade que jurou proteger.

Neste tomo, as revelações sucedem-se a um compasso quase apocalíptico. Os Monarcas revelam as suas verdadeiras intenções, e o protagonista descobre a natureza profunda do poder que nele desperta. O confronto deixa de ser apenas físico: é também uma luta contra o destino, contra a fatalidade inscrita no próprio sistema que o elevou.

O autor aproveita este volume para aprofundar o universo mítico da série. A distinção entre Caçadores e Monarcas, entre Luz e Escuridão, adquire um sentido filosófico; o mundo deixa de ser um simples cenário de aventuras e converte-se num campo de batalha metafísico. As motivações das entidades superiores, antes difusas, tornam-se mais nítidas, e o leitor entrevê o verdadeiro alcance da guerra que se aproxima.

Apesar da grandiosidade dos acontecimentos, há espaço para a introspecção. Chugong regressa, por instantes, à dimensão íntima de Jin-woo: o filho, o irmão, o homem que deseja, apenas, uma vida comum. Essa tensão entre a humanidade perdida e o poder divino é o que confere a este volume a sua densidade emocional.

O desfecho do volume XV deixa o leitor suspenso — não apenas pelo destino do protagonista, mas pelo significado do que ele representa. Solo Leveling já não é, aqui, a história de um simples caçador que se fortalece; é a parábola de um homem que ascende acima de todos e, por isso mesmo, se vê condenado à solidão.

Solo Leveling #15, Dubu e Chugong, Editorial Presença, 180 pp., cor, capa mole, 16,90€

Saga #12: Um novo capítulo na odisseia de Alana e Hazel

Depois de uma longa espera, Saga regressa com o seu volume 12, continuando a saga épica e emocional criada por Brian K. Vaughan e Fiona Staples. Esta nova etapa compila os números #67 a #72 da série original e dá seguimento directo aos acontecimentos dramáticos do volume anterior, levando os leitores novamente a um universo onde amor e guerra coexistem de forma brutal e poética.

O enredo volta a centrar-se em Alana e na filha Hazel, sobreviventes de um conflito galáctico interminável entre dois mundos inimigos. Agora, as duas enfrentam novas ameaças e dilemas morais que põem à prova o legado de Marko — personagem cuja ausência continua a marcar profundamente a história.

Neste volume, Vaughan retoma o tom agridoce que define Saga: uma fusão de ficção científica, fantasia e drama familiar. As cenas oscilam entre momentos de ternura e sequências de violência crua, reflectindo a contradição que está no centro da obra — a tentativa de construir uma vida pacífica num universo dominado pelo ódio e pela guerra.

Os temas de luto, maternidade, resistência e empatia surgem com força renovada. Vaughan mantém o seu talento para o diálogo inteligente e emocional, enquanto Fiona Staples entrega uma arte visualmente deslumbrante: criaturas de design ousado, planetas vibrantes e expressões humanas que comunicam mais do que mil palavras.

Com o volume 12, Staples mostra mais uma vez a sua mestria em criar emoção num cenário de fantasia cósmica, provando que Saga é tão sobre sentimentos quanto sobre mundos alienígena.

Para os leitores assíduos, este é um volume de reconciliação e amadurecimento. Para os novos leitores, é uma excelente oportunidade para descobrir por que Saga é considerada uma das melhores séries de banda desenhada contemporâneas.

Saga #12, Brian K. Vaughan e Fiona Staples, G. Floy Studio, 152 pp., cor, capa dura, 23€

Undertaker #8: Um Mundo Segundo Oz

Com O Mundo Segundo Oz, o oitavo tomo de Undertaker, Xavier Dorison e Ralph Meyer levam a sua sombria saga do Velho Oeste a novos patamares de intensidade e complexidade moral. O que começou como um western lúgubre e quase gótico transforma-se aqui numa reflexão profunda sobre poder, fé e a natureza humana — sem nunca perder o fôlego de uma aventura magistralmente desenhada.

Jonas Crow, o coveiro errante que carrega o peso de um passado sangrento, regressa para mais uma viagem ao limite da redenção. Desta vez, o cenário é uma comunidade isolada, regida por um profeta carismático que se proclama a reencarnação do próprio Oz. A promessa de um “mundo novo” onde todos poderão renascer em pureza esconde, porém, um ambiente de fanatismo, manipulação e medo. Numa pequena vila do Texas arruinada e destruída pela Guerra da Sucessão, Sister Oz, guru da chamada Liga da Virtude, convenceu a população de que conseguiriam recuperar a sua boa fortuna aos olhos do divino se fizessem justiça pelas próprias mãos… e impedissem Eleonor Winthorp de fazer um aborto. Para isso, todo os meios são justificados: humilhação, intimidação, chantagem e, porque não, matar Randolph Prairie, o médico que se oferece para praticar a operação?

Mas Jonas Crow, o Undertaker, ergue-se para proteger aquele que é, apesar de tudo, o seu rival amoroso a fim de permitir a Eleonor que escolha o seu próprio destino.

Dorison constrói aqui um retrato inquietante de uma sociedade à beira do delírio, onde a fé se mistura com o desespero e onde as pessoas se deixam conduzir por líderes que vendem salvação a troco de obediência. É um espelho cruel, mas fascinante, da condição humana — e Jonas, com a sua habitual lucidez cínica, é o observador perfeito desse teatro de ilusões. A escrita de Dorison mantém-se cortante e precisa, equilibrando a dureza do western com momentos de introspecção e ironia. Já a arte de Ralph Meyer continua a ser absolutamente deslumbrante: cada página parece uma pintura, onde a poeira, o suor e o desespero se misturam com a luz dourada do deserto. A cor, assinada por Caroline Delabie, dá vida a esse mundo árido e belo, onde até a morte parece respirar.

O mundo segundo Oz encerra o quarto ciclo de Undertaker, considerada como uma das melhores séries de western da BD europeia.

Esta série, difundida em mais de 14 países entre os quais se inclui Portugal, obteve desde o início da sua publicação em França, em 2015, numerosos prémios e distinções. Salientam-se, o Prix Saint Michel 2015 du Meilleur Dessin, o Prix Le Parisien 2015 de la Meilleur BD, o Prix 2015 des rédacteurs de scenario.com e ainda a distinção Album preferé des lecteurs de BD Gest 2015.

Undertaker #8: Um Mundo Segundo Oz, Xavier Dorison e Ralph Meyer, Ala dos Livros, 64 pp., cor, capa dura, 19,95€

Amadora BD 2025 - Lista de exposições no Núcleo Central do certame

O Amadora BD 2025, o maior festival dedicado à banda desenhada em Portugal, arranca já a 23 de Outubro e decorre até 2 de Novembro, no Parque da Liberdade, na Amadora. Durante dez dias, o evento promete um programa recheado de exposições, lançamentos, conversas, debates, sessões de autógrafos e workshops.

21 de outubro de 2025

Bea Lema no AmadoraBD

A autora galega Bea Lema apresenta em Novembro, no festival AmadoraBD, a sua premiada banda desenhada Corpo de Cristo, recentemente publicada em Portugal pela editora Iguana. A obra, de forte inspiração autobiográfica, aborda com sensibilidade e humor temas como a saúde mental, o fanatismo religioso e o papel das mulheres cuidadoras.

A protagonista, Vera, cresce ao lado de uma mãe profundamente religiosa e com uma doença mental não tratada, enfrentando o estigma e a incompreensão da sociedade. Lema combina desenho e bordado manual — uma técnica que evoca a história da mãe costureira e simboliza a imperfeição e as segundas oportunidades.

Trabalhada ao longo de quase dez anos, a obra foi distinguida com o Prémio do Público em Angoulême 2024 e o Prémio Nacional de BD de Espanha 2024. Além da exposição de originais no AmadoraBD, Bea Lema prepara também uma curta-metragem de animação baseada no livro, a estrear em Novembro.

Ainda há muito por fazer e por falar sobre saúde mental”, afirma Bea Lema — e Corpo de Cristo é um passo corajoso nesse caminho.

20 de outubro de 2025

Jantar Astérix, organizado pela Tacitus, com o apoio da LeYa


Está esgotado o jantar especial (com javali, claro) que se realizará no dia 23 de Outubro, dia do lançamento mundial do novo álbum Astérix na Lusitânia, no Restaurante Portucale, no Porto.

Uma vez que as inscrições para este jantar ultrapassaram muito a lotação do mesmo, já está marcado um novo jantar para dia 30 de Outubro, organizado, tal como o primeiro, pela TACITUS e com o apoio da LeYa.

Neste jantar que será também uma apresentação do livro, haverá vários pratos, em que o javali é rei e Joel Cleto falará sobre a Lusitânia e os povos que aí (e na Calecia) resistiram aos romanos, enquanto Pedro Cleto, destacado especialista e crítico de banda desenhada, abordará a história desta famosa criação.

A sessão, contará também com a colaboração do Cônsul Honorário de França no Porto e da DALVA e com a presença do editor do Astérix em Portugal, Vítor Silva Mota.

Informações e inscrições: visitas@ph-tacitus.pt

Ataque dos Titãs #

O nono volume de Ataque dos Titãs, da autoria de Hajime Isayama, representa um dos pontos de viragem mais intensos de toda a série. Se os volumes anteriores se concentravam sobretudo na luta desesperada pela sobrevivência dentro das muralhas, este tomo leva a narrativa para um terreno mais sombrio: o das revelações e da desconfiança.

Desde as primeiras páginas sente-se uma tensão que ultrapassa o campo de batalha. As relações entre os membros da Tropa de Exploração começam a fragmentar-se, corroídas pelo segredo e pela dúvida. Personagens que outrora combatiam lado a lado começam a ser olhadas com suspeita; o inimigo já não se encontra apenas fora das muralhas, mas também dentro delas.

É neste volume que o leitor começa a entrever o mistério da verdadeira natureza dos Titãs e da origem do poder que os controla. Isayama conduz esta descoberta de modo gradual e inquietante, deixando no ar uma sensação constante de ameaça. A acção alterna entre combates ferozes e momentos de introspecção, em que o peso da verdade se abate sobre os protagonistas.

A arte mantém a crueza e a energia características da série: os rostos deformados pelo medo, os cenários em ruínas e a violência quase física do traço de Isayama contribuem para a atmosfera opressiva. Mas é na narrativa que se sente a maturação do autor. A história deixa de ser apenas um relato de resistência e converte-se numa reflexão sobre a identidade, a traição e o destino.

Eren, Mikasa, Armin e os restantes membros da Tropa enfrentam, neste volume, não apenas os Titãs, mas também as contradições do próprio sistema que os criou. A pergunta que ecoa em cada capítulo é perturbadora: quem é, afinal, o verdadeiro inimigo?

O volume 9 consolida Ataque dos Titãs como uma obra que ultrapassa o género da acção e da fantasia. É uma parábola sobre o medo e o poder, sobre o preço do conhecimento e a fragilidade da confiança humana. No final, o leitor fica com a sensação de que, quanto mais se rasgam as muralhas, mais abismos se revelam dentro das pessoas.

Ataque dos Titãs #9, Hajime Isayama, Distrito Manga, 196 pp., p&b, capa mole, 9,99€

36º Festival Internacional de BD da Amadora

 


18 de outubro de 2025

Alérgica a Pessoas

O livro Alérgica a Pessoas, de Sarah Andersen, é uma colectânea de tiras cómicas que reúnem, com humor e delicadeza, as inquietações quotidianas de uma jovem adulta confrontada com o mundo moderno. A autora, também ilustradora, usa o desenho simples e expressivo como espelho de uma geração simultaneamente ansiosa, criativa e exausta.

Publicada originalmente em inglês sob o título Adulthood Is a Myth, a obra apresenta-nos uma protagonista — uma espécie de alter ego da autora — que atravessa as pequenas tragédias e absurdos da vida adulta: a dificuldade em lidar com pessoas, o desconforto social, o amor pelos gatos, o fascínio e o medo da Internet, e o eterno conflito entre a vontade de ser produtiva e o desejo de permanecer na cama.

A ironia é o traço dominante. Sarah Andersen não ridiculariza os seus temas; antes ri-se de si própria e convida o leitor a reconhecer-se nos mesmos dilemas. Cada tira, embora breve, contém uma verdade emocional: o embaraço nas interacções sociais, a procrastinação, o cansaço perante as expectativas do mundo. É por isso que o livro, sob o véu do humor, fala de questões muito sérias — a ansiedade, a solidão e a auto-aceitação.

Visualmente, as ilustrações de traço preto e branco acentuam a simplicidade do discurso: o essencial está na expressão e no gesto. O contraste entre o desenho leve e o peso emocional dos temas cria um efeito de empatia imediata. Não é necessário ser “alérgico a pessoas” para compreender a sensação de desconforto perante a vida adulta — basta ser humano.

Alérgica a Pessoas é, assim, mais do que um conjunto de piadas. É um retrato terno e divertido da fragilidade contemporânea, da tentativa constante de conciliar vulnerabilidade e humor. Sarah Andersen mostra-nos que rir de si próprio pode ser, afinal, uma forma de sobrevivência.

Alérgica a Pessoas, Sarah Andersen, Desrotina, 136 pp., p&b, capa mole, 16,75€

17 de outubro de 2025

Blacksad Stories: Weekly

Dustin, um jovem furão, mora em Nova York, num pequeno apartamento, com a sua avó russa de nome Chana. Para desespero desta última, uma crente devota, Dustin não tem emprego certo e sobrevive a fazer biscatos. Chana decide então pedir ajuda à pastora Lubansky, uma ovelha que lidera uma cruzada contra o mal o qual, em seu entender, se encontra personificado em publicações voltadas para jovens leitores e que são… as revistas de banda desenhada... O marido da pastora contrata então Dustin para trabalhar num negócio "respeitável": uma agência funerária! Embora resignado, Dustin consegue outro emprego na Proper Comics, administrada por Venables, inimigo implacável dos “Esquadrões da Virtude” da pastora Lubansky. Apesar da ameaça de censura, Venables confia a Dustin a criação de uma fotonovela. Por sua vez, Dustin vai aperceber-se gradualmente de que os negócios do Sr. Lubansky, investigados pelos serviços secretos, escondem muitos segredos...

Uma história no universo Blacksad, que conta como Dustin se tornou no repórter Weekly, companheiro de John Blacksad.

Blacksad Stories: Weekly, Giovanni Rigano e Juan-Diaz Canalès, Ala dos Livros, 64 pp., cor, capa dura, 19,95€ 

16 de outubro de 2025

Les Cahiers de la BD nº 32 — “Quel avenir pour la BD franco-belge ?”

O tema central deste número centra-se principalmente ao futuro da banda desenhada franco-belga. A revista explora a ideia de que este estilo clássico, há muito considerado por alguns como algo ultrapassado ou antiquado, pode ainda ter muito a oferecer — e que há esforços em curso para revitalizá-lo. 

A BD franco-belga enfrenta desafios reais: envelhecimento de público, competição de outros formatos (mídias digitais, comics americanos, manga), custos de produção elevados. No entanto, há um sentido de revivalismo, não só nostálgico, mas criativo: renovar o clássico sem perder a identidade, reinventar os formatos, atrair novos leitores, explorar o humor, o legado gráfico, etc. O número sugere que o futuro da BD franco-belga talvez dependa de equilíbrio: valorizar tradição gráfica e narrativa, ao mesmo tempo em que se adaptam às novas expectativas de público e meios de consumo.

Neste número, podemos ler um dossier por Wilfried Salomé que traça as origens da BD franco-belga — com um olhar para revistas históricas como Spirou, Tintin, Vaillant, e também Pilote

Também tem entrevistas ou contribuições de autores de diferentes gerações, como François Walthéry, François Rivière, Lewis Trondheim, Bastien Vivès e Dino Attanasio. Os autores debatem questões ligadas ao género, suposta marginalização, mas também às oportunidades que novas gerações e novos formatos podem trazer.

Termina com uma seleção comentada de páginas icónicas clássicas da BD franco-belga, para mostrar o que foi feito e como isso ainda inspira.

Para além do tema central, o número oferece:

Perfil de Cosey, num abecedário ilustrado, coincidente com a publicação de seu novo álbum Yiyun

Destaque para Franck Biancarelli, nome emergente, com o seu álbum Green Witch Village, e reflexões sobre as influências dos autores americanos de BD de pós-guerra. 

Um artigo para celebrar os 50 anos de Fluide Glacial, explorando as diferentes “famílias” de humor dentro da revista. 

Críticas, entrevistas e crónicas variadas: sobre autores históricos, festivais, exposições, e temas como o papel e os desafios atuais dos editores e autores da BD. 

Les Cahiers de la BD nº 32, out-dec 2025, 162 pp., 13,90€

Naruto #58: Naruto vs. Itachi!!

O volume 58 de Naruto, intitulado Naruto vs. Itachi!!, cobre os capítulos 545 a 555. 

Estamos no meio da Quarta Guerra Mundial Shinobi. Os shinobi da Aliança enfrentam hordas de inimigos ressuscitados (via Edo Tensei), inclusive figuras poderosas como Nagato Pain e Itachi Uchiha.  

Neste volume teremos revelações sobre os Zetsu brancos: cientistas como Sakura e Shizune descobrem ligações genéticas destes clones com o Primeiro Hokage, e as implicações desse facto para o campo de batalha. 

Gaara confronta fantasmas do passado — nomeadamente seu próprio pai, o Quarto Kazekage, e as memórias de sua infância difícil; cenas emotivas que ajudam a entender melhor a evolução pessoal de Gaara

Finalmente, teremos o confronto direto entre Naruto, Killer Bee, Itachi e Nagato: batalhas, dilemas internos e estratégias de combate intensas. Itachi levanta questões importantes a Naruto sobre Sasuke e sobre a verdade, e Naruto vai revelando o seu próprio crescimento e resolução.

Este volume funciona como ponto de viragem numa das fases mais intensas de Naruto. Em termos de narrativa, Kishimoto equilibra bem momentos de ação com momentos emocionais, evitando que o leitor se sinta esmagado apenas pelas batalhas. A forma como são exploradas as motivações interiores de personagens como Itachi e Gaara contribui para tornar o conflito mais do que “bons contra maus” — há nuances, peso de escolhas passadas, arrependimentos, esperanças e sacrifícios.

Naruto #58: Naruto vs. Itachi!!, Masashi Kishimoto, Devir, 208 pp., p&b, capa mole, 9,99€

Thomas Piketty em Banda Desenhada: “Uma Breve História da Igualdade”

Thomas Piketty tornou-se um dos economistas mais influentes do nosso tempo, conhecido pela sua análise rigorosa sobre as desigualdades e pela forma como cruza economia, história e política para repensar os caminhos do futuro. A sua obra Uma Breve História da Igualdade, publicada em 2021, condensava décadas de investigação num formato acessível e directo, traçando um panorama sobre as lutas históricas pela justiça social e os desafios que ainda enfrentamos.

Agora, essa reflexão ganha uma nova vida: a adaptação para banda desenhada. A linguagem gráfica oferece outra forma de aproximação ao público, transformando conceitos densos em imagens claras e narrativas visuais cativantes. Ao invés de gráficos complexos e longas séries de dados, o leitor encontra personagens, metáforas visuais e sequências que permitem compreender de modo intuitivo a evolução da igualdade ao longo dos séculos.

Mais do que uma simplificação, esta adaptação representa um convite: pensar a economia e a política como parte de uma história comum, feita de avanços e retrocessos, de conquistas democráticas e de lutas sociais que moldaram o mundo em que vivemos. A banda desenhada amplia o alcance de Piketty, abrindo caminho para novos leitores – especialmente jovens – que talvez não se aproximassem de um tratado económico, mas que reconhecem na arte sequencial uma forma envolvente de aprender e reflectir.

Ao folhear esta obra em BD, percebemos que a igualdade não é apenas uma questão de números ou estatísticas: é uma narrativa humana, feita de escolhas colectivas. E talvez seja justamente aí que reside a força desta adaptação – mostrar que a luta por uma sociedade mais justa pode ser contada como uma história, e que todos nós somos parte dela.

Uma Breve História da Igualdade. Sebastien Vassant e Stephen Derberg, Temas e Debates, 104 pp., capa mole, cor, 19,90€

15 de outubro de 2025

Blue Exorcist #29

Com o volume 29 de Blue Exorcist, Kazue Kato conduz-nos a uma fase decisiva da sua narrativa: a guerra entre os exorcistas e Satan atinge o ponto de não retorno. Todos os fios que vinham sendo tecidos ao longo dos volumes anteriores convergem agora em batalhas intensas, revelações inesperadas e escolhas que poderão redefinir o destino de Rin e dos seus companheiros.

Neste tomo, “o próprio tempo começa a contorcer-se” sob o poder destrutivo de Satan, e a autora leva a tensão narrativa a um novo patamar.

Os Cavaleiros da Cruz Verdadeira intensificam o assalto às forças demoníacas, enquanto Rin enfrenta Satan frente a frente, suportando ferimentos que desafiam a própria morte. A sua natureza demoníaca permite-lhe regenerar-se e continuar a luta, mas o preço é cada vez mais alto.

Entretanto, Shemihaza prepara um ritual arriscado para cristalizar e aprisionar Satan, com a ajuda crucial de Shiemi, cuja importância na história atinge aqui o seu auge. À medida que o poder de Satan cresce, o tempo e a realidade começam a distorcer-se, mostrando vislumbres de futuros possíveis — e impossíveis — para todos os envolvidos.

Em contraste com volumes mais pausados, o 29 é puro clímax. É o momento em que promessas antigas se cumprem e segredos são revelados. O ritmo é mais acelerado e o tom mais sombrio. Há uma clara sensação de aproximação ao desfecho da saga.

Blue Exorcist #29, Kazue Kato, Devir, 220 pp., p&b, capa mole, 9,99€

Snoopy: A Descolar! – Um novo voo para o lendário beagle

Já se encontra nas livrarias, através da editora portuguesa Nuvem de Letras o livro Snoopy: A Descolar! – pranchas recolhidas da obra de Charles Schulz adaptada para o português de Portugal. Este lançamento coincide com a celebração do 75.º aniversário de Snoopy e da série Peanuts.

Este livro convida o leitor a embarcar nas aventuras imaginativas de Snoopy. Neste volume em particular, destaca-se a sua persona icónica como Ás da Aviação da I Guerra Mundial, voando no seu Sopwith Camel na eterna missão de enfrentar o temido Barão Vermelho

Além disso, o livro reafirma o caráter multifacetado de Snoopy: ele não é apenas um cãozinho relaxado, mas um ser com uma imaginação vibrante — ora encarna abutre, ora piranha, ora Joe Cool...

A edição portuguesa funciona como porta de entrada para novos leitores e como celebração nostálgica para fãs antigos, oferecendo um texto acessível e fiel ao espírito de Schulz.

Snoopy: A Descolar!, Charles Schulz, Nuvem de Letras, 176 pp., cor, capa mole, 15,95€

Kaiju Nº 8 #9: Preparar para a Catástrofe

Este nono volume de Kaiju Nº 8 continua a desenrolar os preparativos da Força de Defesa do Japão face a ameaças kaiju cada vez mais intensas, ao mesmo tempo que aprofunda os conflitos internos e os dilemas dos personagens. 

No presente tomo Reno torna-se o primeiro utilizador compatível do Kaiju Nº 6 na história, o que o coloca numa posição inédita de poder e responsabilidade.  Por outro lado, Kafka Hibino continua o seu treino sob orientação de Hoshina, aprendendo técnicas de combate em esquadrão, algo que vai muito além do seu papel anterior como responsável pela limpeza no campo de batalha. 

Kikoru ganha autorização de Narumi para herdar uma arma poderosa que pertencia à sua mãe — um momento que ressoa emocionalmente, ligando passado e legado. Também paira sobre todos o espectro do Kaiju Nº 9, cuja ameaça cresce e obriga a Força de Defesa a se reorganizar, treinar, preparar-se para algo que pode ser catastrófico.   

Kaiju Nº 8 chega num momento em que temas como crise climática, desastres naturais e deslocações (físicas ou morais) assumem cada vez mais relevância. Ver “monstros gigantes” atacar terrenos humanos é uma metáfora potente – para quem vive num país que já sente os efeitos ambientais ou extremos climáticos, isso pode ressoar.

A noção de “defender” terras ameaçadas, de enfrentar algo que parece maior do que nós, ou “preparar-se para o pior” através de cooperação, treino, sacrifício — esses são temas universais, mas que ganham significado diferente num contexto português, onde há debates sobre resiliência, desastre natural (incêndios, cheias), responsabilidade coletiva.

Também o legado, a herança, a memória são conceitos muito presentes na cultura portuguesa – pensar em família, nas gerações anteriores, no peso da história. Momentos como o de Kikoru herdar algo da mãe trazem uma ressonância extra num leitor português que valoriza esse elemento identitário.

No campo da banda desenhada/manga, Kaiju Nº 8 representa bem o que muitos leitores procuram: acção bem construída, monstros, visuais fortes, mas também personagens com motivações reais, dilemas morais – não só “lutar para vencer”, mas “lutar para preservar”, “lutar para ser quem sou”.

Kaiju Nº 8 #9, Naoya Matsumoto, Devir, 192 pp., p&b, capa mole, 9,99€

Fenómeno de popularidade da BD japonesa "Sailor Moon" sai em Portugal

A icónica manga japonesa Sailor Moon – Navegantes da Lua, criada por Naoko Takeuchi nos anos 1990, vai finalmente ser publicada em português europeu. A editora Distrito Manga (grupo Penguin Random House) lança o primeiro volume no dia 20 de outubro, com os restantes 11 volumes a serem editados progressivamente — três por ano.

Esta é a primeira edição oficial em português europeu, baseada numa adaptação e revisão da versão brasileira da JBC Brasil.

A série acompanha Tsukino Usagi, uma adolescente que descobre possuir poderes mágicos e a missão de proteger o mundo das forças do mal. Misturando fantasia, ação e humor, Sailor Moon tornou-se um símbolo de empoderamento feminino e foi pioneira na representação de personagens queer.

Desde a sua estreia nos anos 1990, o universo de Sailor Moon expandiu-se para séries animadas, filmes, espetáculos e videojogos, mantendo-se um fenómeno cultural global.

Com esta publicação, Salor Moon junta-se ao catálogo da Distrito Manga, que inclui outros clássicos da banda desenhada japonesa como Ataque dos Titãs, Ghost in the Shell e Akira.


13 de outubro de 2025

Anaïs Nin - No mar das mentiras

Autora suíça radicada em parte na Bélgica, Léonie Bischoff (nasceu em 1981) dedica oito anos para conceber este romance gráfico inspirado fortemente nos diários de Anaïs Nin, assim como na sua correspondência e vida pessoal. 

Publicado originalmente em 2020 pelas Éditions Casterman, em francês, e depois traduzido para várias línguas, conta com uma edição de luxo com extras (desenhos preparatórios, story-boards, etc.).  Agora, é publicado em português pela Devir.

A narrativa focaliza os anos de formação de Anaïs Nin, principalmente no início da década de 1930. É um período anterior à fama literária plena, em que ela vive entre Paris e outras cidades, casada com Hugo Guiler, mas em profunda inquietude interior. 

O diário íntimo de Nin funciona como um fio condutor da narrativa: ponto de fuga, instrumento de autoconhecimento, confidente, espelho e, simultaneamente, instrumento de ambiguidade. Através de encontros decisivos — em especial com Henry Miller — ela começa a libertar-se de convenções literárias e sociais, explorando erotismo, sexualidade, desejo, relações intensas e também tensões familiares (incluindo episódios controversos, como o relacionamento com o pai, como relatado nos diários) que moldam sua identidade e escrita.

O estilo de desenho de Bischoff é delicado, com traços finos, contornos suaves; uso de lápis com mina multicolorido para dar vibração cromática silenciosa. Usa uma paleta de cores que oscila entre tons pastéis e momentos mais sombrios, consoante os estados emocionais de Anaïs. A natureza, elementos florais, formas orgânicas, o mar, imagens marinhas, metáforas visuais são recorrentes. 

A obra foi bem recebida, tanto pela crítica literária e especializada em BD, como pelo público. Contudo, alguma crítica aponta que, embora seja uma leitura intensa e bela, pode incomodar pela crueza de algumas revelações íntimas (incesto, múltiplas relações, inclusive os conflitos morais internos de Nin). 

Anaïs Nin - No mar das mentiras, Léonie Bischoff, Devir, 192 pp., cor, capa dura, 22€

9 de outubro de 2025

Crónicas de Enerelis #7

Neste sétimo volume, em pré-venda até ao final do mês, Eyren e os seus companheiros regressam às missões de Nível 4 depois de salvarem Eli das mãos de um grupo de mercenários. Após uma breve ausência, Eli cumpre a promessa de lhes ensinar o feitiço de Invocação de Almas. Porém, a execução desta magia revela-se um desafio para Eyren, que se confronta com frustração e dúvidas sobre si próprio e o seu papel como mago.

Enquanto isso, forças misteriosas começam a mover-se nas sombras. Peças invisíveis entram em jogo, despertando monstros adormecidos e ameaçando o equilíbrio. Que segredos ocultam as Almas Incarnadas? E como reagirão os maegian perante o despertar de uma nova força que promete alterar tudo o que conhecem?

As Crónicas de Enerelis foram criadas por Patrícia Costa, fortemente influenciada pela fantasia épica e pelo estilo manga. A obra distingue-se pelo mundo imaginado, pelas criaturas e forças sobrenaturais, e por um protagonista jovem que embarca numa longa jornada repleta de magia, mistérios e crescimento pessoal.

A ideia para Enerelis começou a formar-se entre 2008 e 2015.

Em 2018, Patrícia Costa frequentou um Curso de Iniciação à Arte Sequencial com Susana Resende, onde começou a transformar grande parte do argumento em arte sequencial. O primeiro volume, intitulado Prelúdio, foi financiado através de crowdfunding na plataforma PPL, tendo ultrapassado o objectivo inicial.

Enerelis é um dos três mundos paralelos à Terra. Nele coexistem duas forças opostas: Nox e Aether, cuja influência determina a magia, as raças e as capacidades sobrenaturais do mundo. Após cerca de quinze anos de paz, antigos conflitos voltam a emergir, marcando o início dos acontecimentos narrados nas Crónicas.

Crónicas de Enerelis #7: Monstros, Patrícia Costa, edição do autor, 192 pp., p&b, capa mole, 26€

8 de outubro de 2025

Exposição da Mafalda em Óbidos

 


Gannibal #5

O quinto volume de Gannibal, de Masaaki Ninomiya, aprofunda de forma arrepiante a tensão e o mistério que têm tornado esta série uma das mais perturbadoras e fascinantes do thriller japonês contemporâneo. Depois de quatro tomos a construir um ambiente de suspeita e claustrofobia, este capítulo mergulha de cabeça no horror psicológico e nas zonas mais sombrias da alma humana.

A história retoma o fio da investigação do agente Daigo Agawa, que continua a tentar desvendar o desaparecimento da jovem Yuki e o verdadeiro segredo que assombra a isolada aldeia de Kuge. O que antes eram apenas suspeitas começa agora a ganhar contornos cada vez mais concretos — e macabros.

A cada página, Ninomiya aperta o cerco, expondo as fissuras da comunidade e o peso da tradição que esconde crimes antigos sob uma máscara de normalidade. A aldeia parece um organismo vivo, sufocante, que devora aqueles que ousam questioná-la.

Mais do que uma simples história de canibalismo — literal ou simbólico — Gannibal é uma parábola sobre o medo, a violência e a corrupção da moral quando a sobrevivência é posta à prova. No quinto volume, o autor faz-nos confrontar uma pergunta inquietante: até onde pode ir um homem, convencido de que está a agir pelo bem?

Daigo, que começou como um herói determinado, começa a revelar fendas — não apenas físicas, mas mentais. O terror já não vem apenas dos outros: vem dele próprio, do seu desespero, da sua obsessão, do seu confronto com o abismo.

Masaaki Ninomiya continua a demonstrar uma mestria notável na construção do suspense. As vinhetas alternam entre o silêncio tenso e explosões de brutalidade quase cinematográficas. O uso do contraste — entre a tranquilidade rural e o horror absoluto — é o que dá ao manga a sua força visual e emocional.

O traço, cru e expressivo, acentua a sensação de desconforto. Cada olhar, cada sombra, cada gota de sangue parece ter peso e intenção.

Gannibal #5, Masaaki Ninomiya, A Seita, 192 pp., p&b, capa mole, 11,99€

Tokyo Revengers #7

O sétimo tomo de
Tokyo Revengers, de Ken Wakui, assinala um dos momentos mais intensos e emocionantes desta série que tem conquistado leitores em todo o mundo. Se até aqui Takemichi vinha tentando mudar o passado com esperança e alguma ingenuidade, neste volume começamos a perceber que o preço da lealdade e das escolhas pode ser demasiado alto.

Neste ponto da narrativa, Takemichi continua determinado a impedir o trágico destino de Hinata e a evitar que a Tokyo Manji Gang (Toman) se afunde nas trevas. Contudo, o ambiente dentro do grupo está longe de ser harmonioso. As tensões entre Mikey e Draken, a chegada de novos inimigos e as repercussões de acontecimentos anteriores transformam este volume num verdadeiro ponto de viragem.

O sétimo tomo é um mergulho profundo nas relações entre os membros da Toman. Ken Wakui explora a fragilidade dos laços de amizade e o impacto das decisões impensadas, revelando que, por detrás da imagem de “delinquentes”, existem jovens à procura de um propósito e de um lugar a que pertençam.

Takemichi, por seu lado, começa finalmente a crescer. Já não é apenas o rapaz frágil e hesitante que conhecemos nos primeiros volumes — o peso das viagens entre o passado e o presente começa a moldar-lhe o carácter. Cada derrota e cada perda o aproximam mais do herói que deseja ser, mesmo quando tudo parece perdido.

Ken Wakui mantém o equilíbrio perfeito entre a acção e a emoção, com cenas de combate intensas, expressões faciais marcantes e um ritmo que prende o leitor do início ao fim. A arte é vibrante e cinematográfica, captando com mestria tanto o impacto físico das batalhas como a dor emocional das personagens.

Tokyo Revengers #7, Ken Wakui, Distrito Manga, 200 pp., p&b, capa mole, 10,95€

7 de outubro de 2025

Casemate #194

Está à venda o número 194 da revista francesa Casemate. A capa é dedicada a Bilal. Eis o sumário do número de Outubro:

P.4-6 L’Empire contre-attaque et Lucas s’embourbe sur le tournage de Star Wars
P.8-12 Au nom du Père et des Fils Kennedy… Pelaez ausculte la dynastie
P.14-16 Les Sentiers d’Anahuac au chevet de la culture et des rites aztèques
P.18-20 Souvenirs d’un journaliste de l’AFP dans l’enfer de la guerre d’Indochine
P.22-24 France profonde pénètre dans le cinéma porno des années 1970
P.26-28 Journorama, revue de presse de l’actu BD
P.30-32 L’Écho des Rézos, le meilleur de Facebook, X, Bluesky, Instagram…
P.34-37 Riffaud libère Paris façon trompe-la-mort avec Morvan et Bertail (+2 planches)
P.38-43 Bablet exorcise les peurs profondes en compagnie de Silent Jenny (+4 planches)
P.44-49 Un Lucky Luke peu chanceux traverse l’Ouest dans Dakota 1880 (+4 planches)
P.50-59 Bilal fracasse son Bug dans une guerre du Bien contre le Mal (+4 planches)
P.60-69 Une sélection de 25 BD à découvrir en octobre
P.70-75 Agenda : les 340 sorties d’octobre, les festivals et les expos
P.78-81 Valero se fait une toile dans l’Espagne liberticide de Franco (+2 planches)
P.82-85 Lafebre confronte sa psychiatre perchée à des nazis gratinés (+2 planches)
P.86-91 Les Davodeau sur les sentiers des trous de mémoire (+4 planches)
P.92-95 Pagnol sous toutes les coutures et sur grand écran, par Chomet
P.96-97 Cosset se met à table dans la confortable cuisine de Larsson
P.98 Le courrier du mois à la loupe

Casemate #194, octobre 2025, 100 pp., cor, 9,95€

A vida oculta de Fernando Pessoa

A Vida Oculta de Fernando Pessoa, de André F. Morgado com ilustrações de Alexandre Leoni, chega pela Iguana como uma obra que ousa reimaginar o poeta para além da biografia. Nesta narrativa em banda desenhada, Pessoa não é apenas o escritor fragmentado em múltiplas vozes, mas também a figura secreta de uma ordem que enfrenta forças obscuras que ameaçam Portugal.

Os heterónimos — Caeiro, Reis, Campos e tantos outros — surgem aqui como ecos de feridas interiores, máscaras criadas não apenas para escrever, mas para sobreviver. O livro entrelaça citações autênticas com diálogos reinventados, compondo uma atmosfera onde literatura e sobrenatural se confundem.

O traço sombrio de Leoni acentua a densidade da obra, convocando o leitor para um universo onde cada página é um espelho partido da identidade pessoana. Mais do que contar uma história fantástica, A Vida Oculta de Fernando Pessoa convida a reflectir: até que ponto a heteronímia não foi também um combate íntimo, uma forma de resistir ao invisível?

A obra foi originalmente editada pela Bicho Carpinteiro em 2016 e numa edição numerada em 2018.

A Vida Oculta de Fernando Pessoa, André Morgado e Alexandre Leoni, Iguana, 96 pp., bicromia, capa dura, 17,85€

6 de outubro de 2025

Jantar com Astérix

 


Corpo de Cristo, de Bea Lema — o peso da memória e o amor que cura

Corpo de Cristo é uma novela gráfica autobiográfica criada por Bea Lema (A Coruña, 1985), editada originalmente em galego como O Corpo de Cristo e agora publicada em português pela Iguana, com tradução de Maria Mata

Bea Lema conta a história da sua infância em contacto com uma realidade que muitos preferem esquecer ou ignorar: a doença mental da sua mãe. Quando Vera, a protagonista, era pequena, a sua casa era assombrada por aquilo que a mãe acreditava serem demónios. Sessões de exorcismo até ela ficar de cama, depois psiquiatria, superstições que vão cedendo lugar ao diagnóstico… Mas a transição não é linear, nem limpa. O sofrimento, as excentricidades, o estigma social, o abandono, o amor — tudo isso convive de formas incómodas e poderosas.  

Através dos olhos de Vera, a narrativa explora também as expectativas impostas às mulheres — o papel da filha, da mãe, da esposa — numa sociedade católica, pobre, patriarcal.

O que torna Corpo de Cristo particularmente marcante é não só o conteúdo, mas como Bea Lema escolhe contá-lo.

Corpo de Cristo não ficou despercebido na opinião pública, sendo distinguido com o Premio Nacional de Cómic de Espanha em 2024, tendo vencido, em 2017, o XII Prémio Castelao de Banda Deseñada da Deputación da Coruña

Ao terminar Corpo de Cristo, não ficam apenas imagens ou cenas fortes — o que permanece é uma sensação de presença. Do silêncio, das vozes que cochicham na casa, do corpo que adoecer, do amor que cuida. Fica uma pergunta: como carregamos as verdades que nos moldaram?

Também fica uma esperança, discreta, mas clara. Que reconhecer, nomear, contar — mesmo que com dor — possa ser parte de cura. Que empatia e cuidado sejam meios ativos de relação nesta realidade.

Corpo de Cristo, Bea Lema, Iguana, 184 pp., cor, capa mole, 20,45€

Grão-Mestre do Demonismo #5

Wei Wuxian, movido pela determinação e pela dor, recorre ao poder da Empatia para desvendar a misteriosa causa da morte de Xiao Xingchen. Nesta busca, somos transportados ao passado, a um período de paz frágil: Xiao Xingchen encontrava refúgio no campo, onde conhece A-Jing e desfruta de uma calmaria que parece utópica. 

Essa serenidade é entretanto brutalmente interrompida quando salvam um homem gravemente ferido — Xue Yang, figura que traz consigo charmes e segredos sombrios. Ele vai infiltrando-se na vida do grupo, semeando mentiras, manipulações e preparando o terreno para um confronto que envolverá amizade, rivalidade, lealdades antigas e traições. 

Grão-Mestre do Demonismo #5, Luo Di Cheng Qiu e Mo Xiang Tong Xiu, Editorial Presença, 224 pp., p&b, capa mole, 16,90€


O indispensável de Snoopy

O universo da banda desenhada não seria o mesmo sem Snoopy, o famoso cão beagle criado por Charles M. Schulz. Desde a sua primeira aparição em 1950, Snoopy evoluiu de um cão aparentemente comum para uma das personagens mais ricas, complexas e adoradas da história da cultura popular.

Snoopy surgiu a 4 de Outubro de 1950 na tira Peanuts. Inicialmente, era apenas o cão de Charlie Brown, desenhado de forma simples e comportando-se como um animal de estimação tradicional. No entanto, Schulz rapidamente percebeu o potencial da personagem e, ao longo da década de 1950, começou a dotá-lo de uma vida interior e de uma imaginação que se tornariam a sua marca registada.

Com o tempo, Snoopy deixou de ser apenas um cão e tornou-se um verdadeiro protagonista da tira cómica. A sua personalidade multifacetada cativou leitores de todas as idades:

Sonhador e imaginativo: Snoopy é conhecido pelas suas fantasias, nas quais assume papéis variados — desde aviador na Primeira Guerra Mundial até escritor, advogado ou dançarino.

Independente: raramente age como um “cão obediente”. Snoopy é dono de si, vive de acordo com as próprias regras e nunca perde a sua liberdade.

Divertido e irónico: o humor nasce muitas vezes da sua visão peculiar do mundo e das situações absurdas que cria com a sua imaginação.

Leal à sua maneira: embora egocêntrico, demonstra carinho e fidelidade a Charlie Brown e aos amigos quando mais precisam.

Criativo: adora escrever histórias (que quase sempre começam com “Era uma vez numa noite escura e tempestuosa…”), dançar ou encenar aventuras impossíveis.

Carismático e confiante: ao contrário de Charlie Brown, inseguro e melancólico, Snoopy transborda autoconfiança e estilo.

Neste volume comemorativo, celebra-se os 75 anos dos Peanuts com uma selecção das melhores tiras protagonizadas pelo Snoopy e os seus inseparáveis companheiros — Charlie Brown, Woodstock, Linus, Lucy, Sally e tantos outros. Organizadas por décadas, estas tiras dão-nos o prazer de reencontrar as múltiplas facetas do Snoopy: o ás da aviação da Primeira Guerra Mundial, o escritor fracassado de máquina em riste, o amigo fiel (mas nem sempre obediente), o filósofo do alto do telhado da sua casota.

O indispensável de Snoopy, Charles M. Schulz, Iguana, 384 pp., p&b, capa dura, 30,95€



Um Homem em Declínio

Um Homem em Declínio é talvez a obra mais conhecida de Osamu Dazai, publicada em 1948, pouco antes do suicídio do autor. 

A obra é um romance semiautobiográfico de Osamu Dazai, considerado o Dostoiévski japonês, troca o seu cenário original pré-guerra pelo admirável mundo novo dos anos 1920 nesta adaptação do enfant terrible da manga. 

Retratando-se como um fracasso, o protagonista desta obra narra uma vida aparentemente normal, apesar de se sentir incapaz de compreender os seres humanos. As tentativas de Oba Yozo de se reconciliar com o mundo ao seu redor começam na infância, continuam na adolescência, em que se torna um «palhaço» para mascarar a sua alienação, e eventualmente levam a uma tentativa frustrada de suicídio na idade adulta. Sem sentimentalismos, Yozo regista as crueldades casuais da vida e os seus momentos fugazes de conexão humana e ternura.

Um Homem em Declínio, Usamaru Furuya, Distrito Manga, 608 pp., p&b, capa mole, 23,95€

3 de outubro de 2025

"Astérix na Lusitânia" é apresentada pelos autores no dia 27 em Lisboa

Os heróis gauleses mais famosos do mundo vão finalmente pisar terras lusitanas! O novo álbum de banda desenhada “Astérix na Lusitânia” será apresentado em Lisboa no próximo dia 27 de Outubro, no espaço cultural do El Corte Inglês, com a presença dos autores Fabcaro (argumentista) e Didier Conrad (desenhador). O evento contará ainda com a apresentação do humorista Hugo van der Ding.

A obra chega às livrarias portuguesas e ao mercado internacional já no dia 23 de Outubro, publicada em simultâneo em 19 línguas e dialectos. Este é o 41.º volume da série criada por René Goscinny e Albert Uderzo, que, desde 1959, conquistou gerações de leitores em todo o mundo.

Pela primeira vez, Astérix e Obélix viajam até à antiga Lusitânia, trazendo consigo não só a habitual resistência ao Império Romano, como também referências à História e cultura portuguesas.

Na capa, os gauleses aparecem a subir uma rua de calçada portuguesa, ladeada por casas coloridas, com um rio ou mar ao fundo, repleto de embarcações – uma clara homenagem à paisagem e identidade de Portugal.

Segundo o argumentista Fabcaro, a escolha do nosso país para cenário desta aventura não foi por acaso:

Procurei um destino onde os nossos amigos nunca estiveram, mas também um sítio onde eu quisesse mergulhar enquanto escrevia. Queria um álbum ensolarado, luminoso, num país mediterrânico que remetesse para férias.

Nesta nova história, regressa também uma personagem que os leitores mais atentos recordarão de “O Domínio dos Deuses” (1971): um antigo escravo lusitano que vem pedir ajuda aos intrépidos gauleses.

A expectativa em torno do lançamento é enorme: a tiragem mundial será de cinco milhões de exemplares, dos quais 80.000 chegam a Portugal. Até ao final de setembro, 2.000 exemplares já estavam reservados em pré-venda.

A série Astérix já vendeu mais de 400 milhões de livros em todo o mundo, tornando-se um dos maiores fenómenos da banda desenhada. Criado em 1959, o pequeno gaulês de bigode e o inseparável Obélix continuam a resistir às legiões de Júlio César com a ajuda da poção mágica do druida Panoramix — e agora trazem essa energia para o coração da Lusitânia.

Datas importantes:

13 de Outubro: apresentação oficial em Paris com os autores.

23 de Outubro: lançamento mundial do álbum.

27 de Outubro: apresentação em Lisboa, no El Corte Inglés, com Fabcaro, Didier Conrad e Hugo van der Ding.